22 janeiro 2009

Como a Navalha na Seda

Linhas suaves
Contornos disformes
Escrita à mão
Pela tremula carne

A carta de amor
Embate-se em palavras
Se solta e descreve
O que sente com ressalva

Em tinta azul-suave
As palavras gritam
Criando imagens.
Um recurso covarde,
Que requer coragem.

Fala-se o que se sente,
Formata-se o impalpável
Suaviza-se o diálogo
Impõe-se a imagem.

Decompõe-se a emoção
Rabisca-se com louvor
Mata-se um amor
Em nome da mensagem.

Descrever em palavras
É congelar o mundo
É reduzir a vida,
E perverter o segundo.

Mas discursa-se, assim mesmo
Perdendo-se parte da alma
Para dar maior espaço
Ao que se deixa preso
(E torna um homem insano)

Sangrando em palavras
Avança o escritor no poema
Picotando, torcendo, clamando,
que tal confissão abata a pena.

Em dolorosas letras
Profetiza-se fim amargo
A um gostar tão intenso
E tão temível fardo

Mas, ridicularizando-se,
O poeta enfim se cala,
Decidindo-se, amassa a folha
Joga atoalha
Apaga a luz.
Deixa a sala

(esse é um dos meus que pessoalmente mais gosto. Não são tantos poemas assim, a bem da verdade, mas ainda assim, uma das coisas que mais me divertiu escrever).

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